Os dias de hoje são cada vez mais pautados com exigências, a nível pessoal e profissional e, talvez devido a esse facto existe um aumento da procura para técnicas que consigam trazer o equilíbrio que precisamos.
Explicar o que é meditar não é fácil. De uma forma bastante simples pode-se dizer que é o ato de estar consigo mesmo, mas para muitas pessoas, esse ato, de parar e não fazer nada é bastante difícil. Começam as questões, e talvez a principal será: o que vai acontecer quando paro?
Com a prática continuada da meditação, a tomada de consciência de quem somos, do que pensamos e sentimos começa a desenvolver-se e a aumentar.
A meditação consiste assim, na união de todos os nossos estados de consciência, inclusive, o observador passa a ser o objeto de observação, penetrando mais profundamente na sua verdadeira essência, no seu verdadeiro eu.
Para que isso aconteça, dentro do caminho do yoga, é necessário dominar outros aspetos prévios para se atingir estados meditativos.
Segundo Patañjali, estes aspetos são os 8 membros: yama, nyama, āsana, prānāyāma, pratyāhāra, dhāranā, dhyāna, samādhi.
Estes 8 passos ou membros devem ser vistos como se fossem uma escada evolutiva, ou seja, quando um aspeto for dominado passa-se para outro e assim sucessivamente.
O primeiro passo, são as normas morais, pois a integridade moral é um pré-requisito da prática de yoga. (Feuerstein 2001, p. 306)
Primeiro, o praticante deve libertar a mente através do cumprimento dos yamas e nyamas, que regem a sua vida social e pessoal, caso contrário poderá ficar preso sempre nos mesmos modelos de funcionamento e não evolui.
Outro aspeto, será a preparação do corpo, através de prática de Haṭha Yoga, para permanecer em estados meditativos. Segundo Patañjali, a postura deve ser estável e confortável e os āsanas descritos por ele, são indutores da imobilidade do corpo, que por sua vez ajudam na concentração.
Quando as tensões musculares já não são distrações, quando existe um distanciamento do meio exterior e passa a existir uma maior consciência interna, o praticante começa a desenvolver uma maior consciência do prana pelo seu corpo. (Feuerstein 2001, p. 311)
A ligação entre o meio exterior, conseguida através do cumprimento dos yamas e nyamas com o meio interior, postura corporal e controle da respiração é desenvolvida através de um continuado recolhimento dos sentidos. Quando de facto a mente já não responde aos estímulos exteriores podemos assumir que é quando o pratyāhāra acontece.
De seguida, quando a mente já não se distrai com facilidade e consegue manter o foco num suporte específico, como por exemplo, uma parte do corpo, ou um objeto, está-se a desenvolver a concentração.
A concentração começa assim a expandir-se mais, a tornar-se mais profunda e a preencher toda a consciência.
Quando estes passos estiverem aperfeiçoados, a meditação (dhyāna) começa a fluir mais facilmente, sem esforço.
Samādhi é o último degrau a atingir. O corpo está completamente relaxado como se estivesse a dormir, os seus sentidos de perceção estão alerta, mas está de facto, para além da consciência. (Iyengar, 2001, p.31)
Dentro do caminho do yoga, o autoconhecimento e a autoconsciência, são atingidos através da meditação e esse caminho deve ser lento e feito através do cumprimento das fases mencionadas acima, pois não há resultados, nem imediatos nem rápidos.
O praticante quando está em estado meditativo não perde a lucidez, continua alerta, mas deixa de estar condicionado pelo ambiente exterior.
Existem modificações concretas em algumas funções fisiológicas e na atividade cerebral.
O cérebro é constituído por neurónios ligados entre si e onde se transmitem os impulsos nervosos. Mas os impulsos nervosos só se transmitem se a carga elétrica dos neurónios alcançar um determinado nível. Quando esta situação acontece é produzida uma descarga que origina as ondas cerebrais. (Hernandez 2007, p. 139)
As ondas cerebrais são quatro: beta, alfa, theta e delta. (Hernandez 2007, p. 140)
As ondas beta caracterizam-se por terem uma amplitude baixa e uma frequência alta. São emitidas durante o estado de vigília e estão relacionadas com a consciência externa. São frequentes quando é realizado algum tipo de trabalho físico.
As ondas alfa têm uma frequência mais baixa que as anteriores. Estão relacionadas com um relaxamento profundo e alguns estados meditativos. Neste estado a mente racional diminui a sua atividade.
Nas ondas theta o ritmo de frequência é mais lento que nas ondas alfa. A sua manifestação acontece durante o sono e em estados meditativos mais profundos.
As ondas delta têm uma frequência mais baixa e uma amplitude alta. Manifestam-se durante o sono profundo. Quando, e se se conseguir permanecer consciente neste nível alcança-se o estado de superconsciência, desaparecendo assim os limites entre o nível consciente, subconsciente e inconsciente.
Para o individuo comum, sem prática de yoga, a passagem de um tipo de onda cerebral para outra é feita de forma automática, sem haver uma forma consciente de entrar em estados que produzam as ondas de alfa e theta.
Um praticante regular de yoga consegue aceder a estados que produzem as ondas alfa e theta, ou seja, existe uma vontade consciente de aceder a estas ondas para poder usufruir de todos os seus benefícios. (Hernandez 2007, p.140-142)
Os benefícios da meditação são vários e incluem efeitos nos aspetos físico, emocional, mental e espiritual do praticante.
Destaco os seguintes:
Reduz o consumo de oxigénio e a produção de dióxido de carbono
Diminui a pressão sanguínea e intensifica a circulação
Aumenta a resistência da pele
Ajusta o funcionamento do sistema límbico, melhorando a resposta emocional antes dos acontecimentos e estímulos nervosos
Equilibra a atividade do sistema nervoso
Desce a frequência das ondas cerebrais, predominando as ondas alfa
Incrementa a atividade do hemisfério direito do cérebro
Proporciona um profundo relaxamento físico, emocional e mental
Melhora a saúde estimulando os processos auto curativos
Cria vitalidade
Incrementa a resistência ao stress
Melhora a qualidade do sono
Proporciona estabilidade nervosa
Purifica a mente
Aumenta a atenção e concentração
Proporciona um estado mental claro
Desenvolve o estado de alerta e atenção plena
Desenvolve a criatividade
Proporciona confiança e segurança em si mesmo
Desenvolve o autoconhecimento e a consciência espiritual
(Hernandez 2007, p.142,143)
Tendo assim conhecimento sobre os benefícios da meditação, esta prática deveria ser levada para a nossa vida diária. Existem inúmeros exemplos dos benefícios da meditação ao nível da saúde, mas também começa a ser explorada a outros níveis.
Destaco os seguintes:
Empresas – As empresas ao longo dos últimos tempos têm vindo sofrer alterações ao nível do paradigma empresarial. Começa-se, em alguns casos a promover pequenas alterações, tais como a introdução de horários flexíveis, trabalho feito a partir de casa, e a integração de práticas, nomeadamente práticas de meditação, em que o individuo começa a ser visto e aceite em todas as suas dimensões: física, psicológica, cognitiva.
A meditação começa ao nível individual, mas os benefícios começam a ser expandidos para o grupo e depois para as próprias empresas, na logica em que eu mudo a minha perspetiva, ou o meu modo de estar e começo a influenciar o meio que me rodeia, nas suas várias vertentes.
Alguns exemplos de empresas que já utilizam a meditação: Ford, Google, Nasa, Apple, Ibm, Shell. (www.circuloentreser.org)
Escolas: Sabemos que as escolas cada vez mais são alvo de situações que, embora reflitam aquilo que se vive na sociedade em geral, não deveriam acontecer nas escolas: violência, bullying, cansaço extremo, desmotivação. Nos últimos anos começaram a aparecer escolas com meditação para os seus alunos de forma a ajudar a melhorar alguns comportamentos, melhorar a atenção e concentração durante as aulas e consequente melhoria ao nível de rendimento escolar.
Alguns exemplos são: Agrupamento de escolas da Marinha Grande – mind up, Agrupamento de escolas de Valbom (Gondomar), Agrupamento de escolas João Villaret (Loures). (Pinheiro B. 2018, Julho 15. A meditação que salvou os rapazes tailandeses também cá ajuda nas escolas. Disponível em http: www.publico.pt)
Intervenção social e comunitária – Aqui refiro-me às instituições particulares de solidariedade social que atuam no terreno, ou seja, em bairros de habitação social onde predominam populações em risco de exclusão social. O trabalho feito nestes bairros, de uma forma muito simples, passa muito por uma mudança de condições de vida, nomeadamente ao nível escolar, profissional e desenvolvimento de competências pessoais e sociais. A família é vista como um todo, a intervenção é desenvolvida de forma sistémica. O que inclui e une todas estas esferas, e o que é por vezes o mais difícil de conseguir, é a mudança de mentalidades e abertura de visão para outras realidades que até agora estiveram fechadas para estas populações.
Eu não sei se já existe prática de meditação nestas áreas, nem será objetivo deste texto fazer essa investigação, mas na minha opinião, a prática de meditação poderá trazer benefícios para esta área de intervenção social, no sentido em que aumenta a auto consciência, e o autoconhecimento, para além de todos os benefícios ao nível direto na saúde das populações envolvidas.
Todos estes benefícios irão ser refletidos na intervenção desenvolvida, mais ao nível técnico, nas outras esferas, pessoais e profissionais e na predisposição para a mudança e evolução.
Mas, e para concluir, a prática da meditação dentro destas áreas que mencionei, poderia ser mais abrangente.
Isto é, nas escolas, as práticas de meditação, quando existem são para as crianças e os outros elementos da escola, professores, auxiliares, psicólogos e assistentes sociais (quando existem), não usufruem? Não poderiam ser incluídos? Isto porque se já estão identificados os benefícios, então todos os elementos que fazem parte da vida da criança deveriam ser incluídos, para que esses benefícios sejam gerais.
Na área da intervenção social, passa-se o mesmo. Os profissionais que lidam com as situações, que também estão envolvidos nas problemáticas das populações também deveriam ser incluídos.
Se só se tenta beneficiar uma parte dos envolvidos os resultados nunca serão totalmente satisfatórios e a mudança torna-se mais difícil de acontecer.
Penso que com todas as transformações que a sociedade tem vindo a sofrer ao longo dos tempos, estas práticas, que cada vez mais são estudadas cientificamente e que assim, vão ligando a ciência com a espiritualidade, vão abrindo caminho e vão por si só também ajudar a criar mais transformações, nas diversas dimensões da intervenção humana, mas de uma forma, mais consciente e equilibrada.
Bibliografia
Feuerstein, G. (2001). A tradição do yoga: história, literatura, filosofia e prática. São Paulo: Editora Pensamento Cultrix.
Hernandez, D. (Swami Digambarananda Saraswati (2007). Claves del Yoga: teoria y prática. Barcelona: Editora La Liebre de Marzo
Iyengar, B.K.S. (2001). Light on Yoga. Londres: Editora Thorsons
Pinheiro B. (2018, Julho 15). A meditação que salvou os rapazes tailandeses também cá ajuda nas escolas. Disponível em http:www.publico.pt)
www.circuloentreser.org
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